15/Ago/2022
O governo Jair Bolsonaro festejou como nunca a deflação de 0,68% registrada em julho pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A menos de dois meses de uma eleição em que o presidente permanece em segundo lugar, de acordo com as pesquisas, pouco importa que esse recuo seja pontual e concentrado em itens como energia e combustíveis ou que a inflação acumule um avanço de 10,07% nos últimos 12 meses. Fora das redes sociais, onde a realidade se impõe, a população lida com um cenário generalizado de preços em alta, um quadro ainda mais difícil de ser administrado por famílias vulneráveis que vivem nas maiores cidades brasileiras. O IPCA, como diz sua própria sigla, é amplo. Para calculá-lo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) pesquisa preços de diversos produtos e serviços, divididos em nove grupos: alimentação e bebidas, despesas pessoais, saúde e cuidados pessoais, vestuário, artigos de residência, comunicação, educação, habitação e transportes, em milhares de estabelecimentos nas principais regiões metropolitanas.
Sua metodologia alcança famílias com rendimentos entre 1 e 40 salários-mínimos, ou 90% da população que vive em áreas urbanas. O índice possui uma longa série histórica, e a incorporação de novos hábitos em seus cálculos, como transporte por aplicativos, revela um esforço para que a cesta de itens represente o consumo médio dos brasileiros de forma fidedigna. Ainda que muitas vezes a inflação pareça mais alta do que os números oficiais apontam, não pairam dúvidas sobre sua confiabilidade, o que é muito diferente de afirmar que seus impactos são iguais para todos. Se há deflação para a classe média, a inflação permanece inabalável para os mais pobres. É o que aponta a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), que pesquisa o comportamento dos preços na cidade de São Paulo e pondera seus efeitos conforme a renda. De acordo com a Fipe, só houve deflação em julho, de 0,11%, para as famílias com renda mensal acima de R$ 9.696,00 o equivalente a mais de 8 salários-mínimos.
Para quem recebe entre 3 e 8 salários-mínimos, a inflação subiu 0,17%, e para aqueles com renda entre um e três salários-mínimos, a alta foi de 0,44%, o que permite inferir que o avanço dos preços deva ter sido ainda maior entre os que não conseguem auferir sequer um salário-mínimo mensal. Não é preciso ser um especialista para perceber as conexões entre o aumento da inflação e o crescimento da pobreza, mas há questões que o governo Bolsonaro prefere ignorar. A variação do preço dos combustíveis é indiferente para as famílias que não têm carro e só utilizam transporte público para se deslocar. O que essas famílias realmente percebem é que 63% dos itens pesquisados pelo IBGE, o equivalente a dois terços dos 377 que integram a cesta de produtos do IPCA, ficaram mais caros, entre eles o leite longa vida, que subiu 25,46%. Para elas, não há razão para comemorar a queda de 15,48% no preço da gasolina, até porque esse tipo de medida ainda tem o potencial de prejudicá-las de forma indireta.
Como o barateamento dos combustíveis se deu em parte graças à redução forçada do ICMS, imposto que financia saúde e educação nos Estados, o resultado é a redução da oferta e da qualidade desses serviços públicos, fundamentais para os estratos mais pobres da população. Com um orçamento composto apenas por gastos essenciais para garantir sua sobrevivência, o perfil de consumo dos mais carentes não reflete escolhas, mas apenas limitações e impossibilidades. Não é por outra razão que economistas reverberam a máxima segundo a qual a inflação é um imposto sobre os mais pobres, e é por isso que combatê-la deveria ser prioridade para qualquer governo. É nesse contexto que a incoerência da atuação do Executivo chama ainda mais a atenção. Ao torrar bilhões para agradar a caminhoneiros, taxistas e donos de automóveis, Bolsonaro retroalimenta a inflação que se jacta de enfrentar. Para quem tem fome, tudo o que seu governo tem a oferecer é um Auxílio Brasil corroído e um empréstimo consignado marcado por juros extorsivos. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.