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16/Set/2022

Entrevista com a CEO da FUTURE CARBON GROUP

CEO da Future Carbon Group, Marina Cançado prevê que o crédito de carbono passará pelo processo de comoditização. Entre os operadores deste mercado, ainda não há consenso se tratar tal ativo como "commodity do futuro" é o melhor caminho, mas parece inevitável para que ganhe escala. Com o potencial de movimentar de US$ 7,5 bilhões a US$ 15 bilhões por ano, o Brasil é uma potência na economia do carbono. Em um mercado ainda "artesanal", sem integração entre empresas, Cançado destaca a necessidade de educação sobre o tema e de ações como a do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que lançou, no fim do mês passado, um edital de R$ 100 milhões para compra de créditos de carbono. Todas as gestoras, fundos de investimento, bancos e instituições financeiras têm um time olhando para assunto. Ex-líder de Riquezas Sustentáveis na XP Investimentos, a executiva integra o conselho consultivo do Brazil Climate Summit, evento que se encerra nesta sexta-feira (16/09) em Nova York.

Como a senhora avalia o potencial do mercado de carbono no Brasil?

Marina Cançado: A minha visão e da Future é que o Brasil tem um potencial extremamente importante de gerar créditos de carbono e, com isso, trazer renda para as populações locais de floresta e um modelo de desenvolvimento sustentável. Podemos ser um grande hub de solução para o mundo. E isso não é achismo. Os dados mais recentes de um estudo que a McKinsey & Company está fazendo mostram que o Brasil tem o potencial de representar 15% do mercado de soluções baseadas na natureza, que pode chegar de US$ 50 a 100 bilhões. Assim, o País poderia movimentar de US$ 7,5 a 15 bilhões por ano. Estamos falando de volumes muito significativos para o Brasil, cujo potencial de geração de crédito é comparável apenas ao da Indonésia.

E quais os principais pontos de discussão neste mercado?

Marina Cançado: Acredito que a grande discussão hoje no mercado de crédito carbono é de integridade. Ou seja, se, de fato, aquele projeto foi concebido com uma adicionalidade, com um baseline correto, se a renda vai para a comunidade local, se esta é considerada, se há proteção da biodiversidade. E para trazer mais cor para essa complexidade: quando falamos de projetos de crédito de carbono e floresta, são de pelo menos 30 anos. É preciso considerar que, durante 30 anos, você tem que monitorar e proteger aquela área, cuidar daquela comunidade. É super complexo. E aí vem a desconfiança do mundo, natural, porque conhece pouquíssimo de Amazônia e de Brasil, de ter a segurança para comprar créditos de carbono brasileiros e de que os projetos estão sendo feitos com integridade, nas melhores práticas internacionais. Precisamos romper essa barreira de confiança do mundo para que o Brasil consiga gerar e vender cada vez mais créditos de carbono. O desafio é mostrar para o mundo e que este confie que os projetos de crédito carbono do Brasil têm alta integridade e, por isso, podem ser comprados a um preço de carbono premium, feito com todas as camadas de diligência.

Depois da COP 26 e em meio ao debate de regularização no mercado de carbono, o que é possível perceber quanto à adesão do investidor brasileiro a esse ativo? E à resistência?

Marina Cançado: Minha sensação é que todo mundo tem consciência de que isso vai ser um ativo ambiental financeiro digital muito importante. A gente roda a Faria Lima inteira e todas as gestoras, fundos de investimento, bancos e instituições financeiras têm um time olhando para o assunto. Mas a sensação é que estão todos colocando o pezinho na piscina, ainda achando a água um pouco fria e com falta de coragem para pular. É por isso que ações como a do BNDES, que tem feito movimentações importantes para fomentar o mercado, são tão importantes. Porque é um ativo novo.

Quais os principais desafios ao lidar com esse ativo?

Marina Cançado: Ainda tem um entendimento muito, muito restrito sobre como o crédito de carbono, enquanto ativo financeiro, se comporta. E, sem esse entendimento para gestores de investimento, fica muito difícil saber como tomar o risco de se expor a esse ativo. Estamos em um momento em que precisamos de muita educação, muito aprendizado. A compra e venda ainda é muito bilateral. Então acho que a gente vai evoluir cada vez mais para o mercado. No limite, como você tem uma telinha com o preço das ações e das commodities, no futuro, a ideia é que você tenha um preço para o crédito de carbono. Assim, o mercado consegue entender se está alto ou baixo e a operar mais como ativo financeiro. Mas a gente ainda está distante de chegar lá. O primeiro passo é a educação e aprendizado, na prática, de como operar esse ativo.

O crédito de carbono já foi apelidado de "commodity do futuro". A senhora concorda com esse conceito?

Marina Cançado: O que acontece é que hoje os grandes compradores internacionais querem créditos de carbonos de projetos bem específicos, porque não estão comprando só o crédito de carbono, estão comprando aquela narrativa de estar apoiando um projeto na Amazônia, no encontro de três rios com 'x' pessoas na comunidade, cuja renda está aumentando em tanto. Quando você compra o crédito de carbono de um trader, não tem essa história. Não há consenso ainda entre os atores do mercado de carbono se a comoditização é o melhor caminho. Mas, na minha visão, ela vai acontecer, porque, para dar escala, precisa acontecer. Uma vez que você começa a tratar como ativo financeiro, isso começa a ser 'tradado', você começa a fazer mecanismos de 'head'.

E quais são os outros tipos de créditos ligados ao meio ambiente que teriam essa mesma característica?

Marina Cançado: Na nossa visão, o crédito de carbono é apenas o primeiro ativo ambiental que se tornou financeiro e vão vir muitos outros a reboque. Em um futuro próximo, vamos ter créditos de biodiversidade. Isso significa que haverá um pagamento pela conservação da biodiversidade de uma determinada área. Talvez tenhamos instrumentos parecidos com água e outros serviços ecossistêmicos. O crédito de carbono é apenas o primeiro mecanismo de uma sequência que vai vir pela frente de formas de monetizar e pagar pelos serviços que a natureza e a floresta prestam para nós, porque é assim que você tem o incentivo financeiro para proteger e não desmatar.

Fonte: Broadcast Agro.