08/Mar/2024
A Organização Mundial do Comércio (OMC) encerrou sem acordos sua reunião ministerial de Abu Dabi, nos Emirados Árabes Unidos, nas primeiras horas de 2 de março. Os 164 países que a integram não alcançaram consenso em temas relevantes, como agricultura, pesca e facilitação de investimentos. A ausência de qualquer movimento dos Estados Unidos em favor da reconstrução do mecanismo de solução de controvérsias, sem efetividade há sete anos, arrematou o fracasso do encontro. Restou o preocupante quadro de paralisia da organização, tanto para aplicar novas disciplinas como para julgar práticas ilegais ou abusivas no comércio internacional. Para não dizer que nada saiu do encontro de Abu Dabi, houve consenso sobre a prorrogação por mais dois anos da isenção de tarifas de importação sobre o comércio eletrônico de dados. De resto, o desprezo dos Estados Unidos, cujo principal negociador se retirou antes do fim da reunião, e o veto da Índia a todos os acordos possíveis impediram o saldo esperado.
A delegação da Índia obstruiu até mesmo a inclusão, no aparato jurídico da OMC, de um acerto fechado previamente por 122 países sobre facilitação de investimentos, que previa redução de burocracia e maior transparência por governos e empresas. A delegação da Índia chegou a Abu Dabi com o firme propósito de ver consagrada sua proposta de legalizar os subsídios aos seus estoques agrícolas e de, em caso de decepção, vetar todos os demais acordos. A estratégia não poderia ser mais espúria. Agiram corretamente o Brasil e outros exportadores de alimentos ao recusarem a chantagem, que ocultava uma escaramuça. Como denunciou a Tailândia, a Índia exporta parte de seus estoques, que deveriam atender exclusivamente o mercado doméstico, uma clara infração às regras vigentes. Não é de hoje que a Índia acaba com os consensos na área agrícola, em claro confronto às posições brasileiras. Na Rodada Doha, contribuiu para o fracasso do acordo sobre redução de tarifas e de subsídios domésticos aos bens do agronegócio. Desta vez, fez ainda o desfavor de vetar a proposta da China de aperfeiçoamento das disciplinas do acordo de pesca, de 2022.
As divergências entre Brasil, Índia e China atestam seus interesses conflitantes na OMC e a chance remota de haver alinhamento no Brics. Fato é que a 13ª reunião ministerial da OMC apenas confirmou a estagnação da entidade que se verifica desde a ruína da Rodada Doha, em 2001. Tornou-se mais difícil construir consensos sobre temas negligenciados ao longo dos 30 anos da organização, como o comércio agrícola, e disciplinar novos setores, como o de alta tecnologia. A organização não prosperou nem mesmo como tribunal de práticas ilegais ou abusivas. Seu mecanismo de solução de controvérsias está paralisado desde 2017 pelos Estados Unidos, que impediram a evolução dessa discussão em Abu Dabi. Trata-se de uma péssima notícia num mundo em transformação acelerada, desafiado por tensões geopolíticas e conflitos com repercussão no comércio internacional. Ao respirar por aparelhos, a OMC mal consegue preservar o arcabouço jurídico do comércio internacional. Sem ela, no entanto, seria bem pior. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.