08/Aug/2024
O desmatamento para produção agropecuária é, comprovadamente, uma das áreas mais emissoras de gases de efeito estufa (GEE) do Brasil. E as tentativas de regular o setor, colocando travas de poluição, têm falhado no mundo todo, especialmente pela dificuldade em construir metodologias confiáveis e aplicáveis para diferentes solos, biomas e cultivos. Mas a Citrosuco, maior produtora de suco de laranja do mundo, em parceria com a consultoria ECCON Soluções Ambientais, e a Reservas Votorantim, empresa de gestão florestal do Grupo Votorantim, encararam esse desafio. Ao longo de mais de um ano e meio, dezenas de pessoas das três empresas se debruçaram sobre as metodologias de pagamento por serviço ambiental (PSA) e créditos de carbono, além de estudos científicos no Brasil e no exterior, para chegar a linhas-mestras imprescindíveis para que produtores agrícolas combinem práticas sustentáveis no campo e preservação de floresta nativa.
Chamada de PSA Carbon Agro Perene, a nova metodologia busca remunerar quem geram benefícios adicionais ao meio ambiente e à sociedade. A visão na Citrosuco é que o agro brasileiro esteja do lado da solução e não do problema. Mas, ainda, pouca gente no mundo entende dessa maneira. Apesar de ser um negócio que promove a agenda climática, é algo que pode melhorar a produção agrícola. A Citrosuco captura, por ano, 400 mil toneladas de dióxido de carbono equivalente (tCO2e) pelo simples fato de a operação existir, uma referência aos pomares de laranja da plantação. É resultado de uma combinação de fatores, que inclui termos uma grande área preservada, boas práticas de manejo sustentável, e uso de tecnologia para ter mais eficiência e sustentabilidade. Pela PSA Carbon Agro Perene, a remuneração dos produtores é feita de acordo com a valoração dos serviços ambientais, que se desdobram em uma série de indicadores ecossistêmicos e indicadores de boas práticas agrícolas.
Para isso, são aplicadas métricas que avaliam a conservação florestal, manutenção e melhoria de qualidade de água, manutenção de habitat para biodiversidade (fauna e flora), manutenção de ecossistemas, oferecimento de infraestrutura de suporte a boas práticas agrícolas, boas práticas de manejo sustentável, entre outras. Ou seja, funciona como um incentivo financeiro para a conservação ambiental e para a adoção de práticas agrícolas sustentáveis. A unidade de medida é o C+ (Carbono Plus). Cada C+ equivale à remoção de uma tonelada de gás carbônico equivalente (CO2) da atmosfera. A ECCON Soluções Ambientais explica que, hoje, em muitos casos, são usadas as metodologias de medição de biomassa e serviços ambientais de fora do País, especialmente de países mais desenvolvidos economicamente, mas que não tem a mesma riqueza de biodiversidade e a complexidade dos biomas brasileiros.
Por isso, a intenção das empresas foi buscar algo que nascesse do Brasil a partir das particularidades locais de sociobiodiversidade. Foi criada uma metodologia que premia o agro responsável, acima do básico, e contribui com aperfeiçoamentos dos projetos de carbono, ao criar uma metodologia pautada na realidade brasileira. Por alguns meses, a metodologia ficará em consulta pública, no site da Citrosuco, para quem quiser entender seus detalhes e enviar críticas, sugestões e comentários. A etapa seguinte é iniciar um projeto piloto com a Citrosuco. É uma metodologia inovadora que passará por escrutínio público exatamente para ter validação de primeira linha, nacional e internacional. A ideia é ouvir os especialistas e aperfeiçoar a metodologia. Além de lançar no Brasil, também haverá apresentações em Nova York (EUA), durante a Climate Week, em setembro. Segundo a Reservas Votorantim, a versão a ser apresentada ao mercado é “precisa” e eficiente, fruto de muito estudo, análise e seleção do que realmente pode ser aplicado ao Brasil e dar resultado.
Está sendo proposta uma metodologia do mundo agro, com todos os critérios baseados em ciência e que possa dar contribuição efetiva. A proposta foi seguir os critérios que a Câmara de Comércio Internacional (ICC) cobra para o mercado de crédito de carbono, mas se preocupou com a praticidade de execução da metodologia. A ideia é facilitar a captura de informações com tecnologia, automatizando, por exemplo, captura de dados de forma automatizada a partir de imagens de satélites e outras formas de rastreamento. O PSA Carbon Agro é uma derivação de outra metodologia, o PSA Carbonflor, desenvolvida pela ECCON com contribuições da Reservas Votorantim ao longo de quatro anos, e cujo objetivo é gerar “C+” a partir da comprovada conservação em áreas florestais. O método já foi testado no Legado das Águas, que pertence a Reservas Votorantim, e os créditos gerados na primeira safra de “C+” foram vendidos ao escritório de advocacia Pinheiro Neto, em 2023.
A ECCON explica que quase metade dos critérios tem relação com conservação florestal, escrita a partir do PSA Carbonflor e seus aprendizados. Mas, para desenhar a outra parte, foi preciso mergulhar na operação da Citrosuco, nos materiais que produzia, no método de produção usado e em experiências internacionais. Apesar de a metodologia ser direcionada hoje para quem quer gerar e vender créditos no mercado voluntário, ela é pensada também para atender ao mercado de carbono regulado nacional, uma vez que o Projeto de Lei em trâmite no Congresso prevê a priorização de metodologias nacionais. Inicialmente, a PSA Agro Perene é direcionada para cultivo de culturas perenes, como o nome diz, a exemplo do cacau, café, seringueira e frutas em geral. E não vai se limitar apenas à laranja. Não é só para o Brasil, mas poderá ser adaptada para outros países. A ECCON Soluções Ambientais pontua que a pressão está maior para o agronegócio se envolver na agenda climática.
Anos atrás, a preocupação climática se limitava ao impacto na produção. Agora, além da segurança alimentar, a preocupação também é com a sobrevivência do cultivo e da empresa. A metodologia foi desenhada já com preocupação em poder ser usada também por propriedades menores, diferente dos projetos de crédito de carbono do tipo REDD+, de prevenção ao desmatamento, que são viabilizados em propriedades acima de 10 mil hectares. A ideia de trazer o uso de tecnologia para a metodologia permite que pequenos produtores possam gerar créditos respeitáveis e íntegros e gerem valor pela conservação, algo que não tinham. Na análise de desempenho, também estão aspectos socioculturais, tanto aqueles ligados a relações de trabalho e relações sociais no campo que vão além da legislação, quanto a avaliação do contexto sociocultural da área e seu entorno, que não necessariamente tem a ver com as boas práticas agrícolas, mas contribui para o componente de conservação dos ecossistemas.
Sobre a expectativa de geração de créditos C+ para a Citrosuco, como pioneira na aplicação da metodologia, e como se dará a distribuição de recursos gerados a partir da venda desses créditos entre empresas e produtores/fornecedores, a ECCON reforça que é preciso, antes, definir a versão final da metodologia, após a contribuição e análise da audiência pública. É preciso definir o que será, de fato, adicional; quais as boas práticas de conservação florestal, quais as boas práticas no agro, e o que elas trazem de adicional ao meio ambiente e à sociedade. O grande benefício da iniciativa é incentivar as empresas a adotarem as boas práticas, mais do que a geração de receita a partir do crédito em si. A Citrosuco conta que a iniciativa está alinhada com as metas da empresa de redução da emissão de gases de efeito estufa (GEE) nos escopos 1 e 2. Até 2030, a intenção é reduzir em 28% as emissões. Com a troca de fontes de energia, a empresa já atingiu 10%, mas, para alcançar o objetivo final, é preciso ir além.
A visão é em conjunto. Ao mesmo tempo em que continua expandindo práticas agrossustentáveis, a empresa mantém a conservação das áreas. A criação da metodologia ajuda a dar um olhar sistêmico ao produtor rural e incentiva práticas sustentáveis que geram direito à monetização desse trabalho no futuro. A visão ecossistêmica passa, por exemplo, pela gestão de recursos hídricos e uso de defensivos agrícolas, que podem prejudicar o solo se usados em excesso ou erroneamente. A empresa aplica irrigação por gotejamento para fazer gestão de recursos hídricos e concluiu recentemente os primeiros reservatórios para captura de água da chuva. Além disso, com drones que fazem o mapeamento do pomar, e softwares que mostram com precisão quais pés precisam de fertilizantes e agroquímicos naquele momento, também há um controle maior do uso de defensivos agrícolas. Tem uma inovação grande no campo. Fonte: Globo Rural. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.