20/Aug/2024
A segurança alimentar e nutricional (SAN) é uma preocupação central em políticas globais, refletida em legislações que consagram o direito à alimentação adequada e sustentável. Em resposta às crescentes pressões geopolíticas e às necessidades internas, diversos países têm adotado estratégias para garantir a estabilidade dos sistemas alimentares. Este estudo detém-se especificamente nos produtos essenciais, como, milho, trigo, carne bovina e leite em pó, cuja produção, consumo e gestão de estoques desempenham papéis críticos na segurança alimentar global. Analisar esses alimentos não só revela as dinâmicas do mercado e as políticas adotadas em diferentes regiões, mas também destaca os desafios enfrentados na busca por uma segurança alimentar resiliente. A Declaração de Roma sobre Segurança Alimentar Mundial (1996) destaca a necessidade de cooperação internacional para assegurar o acesso universal a alimentos seguros e nutritivos.
A pandemia de Covid-19 e conflitos geopolíticos recentes sublinharam a importância de estoques estratégicos e políticas robustas para enfrentar crises alimentares, com a União Europeia e os Estados Unidos intensificando medidas de segurança alimentar. Recentemente, a União Europeia (UE) vem enfrentando desafios devido à guerra na Ucrânia, destacando a importância da Política Agrícola Comum (PAC). A PAC não apenas sustenta a agricultura europeia, mas também desempenha papel vital na segurança alimentar da região. A política recentemente reformada, com foco em práticas sustentáveis e apoio a pequenos agricultores, visa fortalecer a resiliência do setor agrícola em face de turbulências externas. A UE depende em até 40% de importações para suprir demandas sazonais de grãos, como resultado direto da crise na Ucrânia. Em 2024/2025, a produção de milho está projetada para uma leve recuperação, enquanto a produção de trigo, estável, atende tanto ao consumo interno quanto às exportações. A produção de carne bovina e leite em pó mantém-se estável, refletindo a robustez do setor.
Nos Estados Unidos, a alta capacidade produtiva e os programas de assistência alimentar, como o SNAP, asseguram um elevado grau de segurança alimentar. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) desempenha papel crucial, mantendo estoques estratégicos e regulando o mercado para evitar escassez. A atuação rigorosa da Food and Drug Administration (FDA) e outras agências também garantem a inocuidade dos alimentos, fortalecendo a resiliência do sistema alimentar norte-americano. Em 2024/2025, a projeção da produção de milho, trigo, carne bovina e leite em pó está robusta, garantindo a estabilidade do mercado interno e a competitividade nas exportações. No Brasil, a Lei Orgânica da Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN) de 2006 consolidou o direito à alimentação adequada como um direito fundamental. No entanto, a falta de uma política de estoques atualizada representa uma vulnerabilidade. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) anunciou a compra de 500 mil toneladas de milho para estabilizar preços e garantir o abastecimento, destacando a necessidade de políticas robustas para enfrentar crises e garantir a segurança alimentar.
A produção de milho, trigo, carne bovina e leite em pó tem mostrado crescimento constante, com aumentos projetados para 2024/2025, refletindo o compromisso do Brasil em fortalecer a segurança alimentar e sua posição no mercado internacional. Analisando dados de produção e consumo, observa-se que Brasil, Estados Unidos e União Europeia adotam estratégias diversas para garantir a segurança alimentar e gerenciar estoques estratégicos. O Brasil aumenta suas compras de milho para regular preços, os Estados Unidos mantêm estoques significativos e programas de assistência, enquanto a União Europeia reforça sua resiliência agrícola através da PAC e importações estratégicas. A produção de milho aumentou de 87 milhões de toneladas em 2020/2021 para uma projeção de 127 milhões de toneladas em 2024/2025. Este crescimento robusto permitiu o aumento da exportação, que passou de 21,023 milhões de toneladas para 49 milhões de toneladas no mesmo período.
No entanto, os estoques finais variaram significativamente, de 4,653 milhões de toneladas para 2,841 milhões de toneladas, indicando uma gestão dinâmica de estoques e uma demanda interna crescente, projetada para atingir 80,5 milhões toneladas em 2024/2025. A produção de milho na União Europeia enfrentou desafios, com uma queda acentuada de 71,672 milhões de toneladas em 2021/2022 para 52,292 milhões de toneladas em 2022/2023. Apesar de uma leve recuperação esperada para 2024/2025, as importações aumentaram significativamente para suprir a demanda, refletindo a dependência da região das importações para estabilizar o consumo interno estimado em 75,6 milhões toneladas. Os Estados Unidos são um dos maiores produtores de milho, com uma produção projetada de 384,741 milhões de toneladas para 2024/2025. Apesar de algumas flutuações na produção e nas exportações, os estoques finais se mantêm substanciais, garantindo a estabilidade do mercado interno e a competitividade nas exportações.
No Brasil, a área colhida com trigo aumentou consistentemente, de 2,342 mil hectares em 2020/2021 para uma projeção de 3,5 mil hectares em 2024/2025. Consequentemente, a produção cresceu para 9,5 milhões toneladas, refletindo a expansão na capacidade agrícola. No entanto, o Brasil depende de importações, que, embora tenham diminuído de 6,395 milhões toneladas para uma projeção de 5,5 milhões toneladas, continuam essenciais para suprir o consumo interno de 11,9 milhões toneladas. A União Europeia mantém uma produção estável de trigo, com pequenas flutuações ao longo dos anos. A produção projetada de 128 milhões toneladas para 2024/2025 é suficiente para atender o consumo interno e garantir exportações robustas de 34,5 milhões toneladas. Os estoques finais, embora voláteis, mostram uma capacidade de resposta rápida às mudanças de mercado. Nos Estados Unidos, a projeção da produção de trigo é de aumento para 53,93 milhões toneladas em 2024/2025. O consumo interno está estimado em 30,917 milhões toneladas e está amparado por uma política de estoques finais substanciais, que ajudam a mitigar os riscos de escassez e a manter a estabilidade dos preços no mercado interno.
No Brasil, a produção de carne bovina está projetada para aumentar de 9,97 milhões toneladas em 2020/2021 para 11,35 milhões toneladas em 2024/2025. As exportações aumentaram significativamente, indicando a competitividade do Brasil no mercado internacional de carne bovina. O consumo interno, embora crescente, está plenamente abastecido em função da robustez da produção nacional. Na União Europeia, a produção de carne bovina tem mostrado estabilidade, com uma produção projetada de 6,5 milhões toneladas para 2024/2025. O consumo interno é de 6,16 milhões de toneladas é complementado por importações, indicando uma autossuficiência relativa na produção de carne bovina. Os Estados Unidos são os maiores produtores e consumidores de carne bovina do mundo, com uma produção projetada de 12,142 milhões toneladas em 2024/2025. O consumo interno é alto, e as exportações desempenham um papel importante na economia da carne bovina dos Estados Unidos. Os estoques finais, embora pequenos, são geridos de forma a garantir a disponibilidade contínua no mercado interno.
No Brasil, a produção de leite em pó integral seco tem mostrado crescimento constante, com uma projeção de 590 mil toneladas para 2024/2025. As importações, embora variáveis, são essenciais para suprir o consumo interno crescente, projetado para 725 mil toneladas. A União Europeia é um dos maiores produtores de leite em pó integral seco, com uma produção estável de 620 mil toneladas projetadas para 2024/2025. As exportações robustas indicam a competitividade da União Europeia neste mercado. As importações são pequenas. Nos Estados Unidos, a produção de leite em pó integral seco está projetada para 50 mil toneladas em 2024/2025, com um consumo interno robusto e exportações que desempenham um papel significativo no mercado. A análise dos dados de produção e consumo de milho, trigo, carne bovina e leite em pó nos principais mercados globais revela a importância de políticas eficazes de segurança alimentar e gestão de estoques. Cada região adota estratégias distintas, refletindo suas capacidades produtivas e necessidades específicas.
As tendências destacadas e os gráficos selecionados fornecem uma visão abrangente das dinâmicas de mercado e dos desafios enfrentados por Brasil, União Europeia e Estados Unidos em assegurar a estabilidade alimentar. O Brasil tem historicamente priorizado políticas de crédito e seguro rural em detrimento da formação de estoques estratégicos. A ausência de uma política robusta de estoques públicos tem exposto o país a vulnerabilidades em momentos de crise, como observado no mercado de arroz, feijão e milho entre 2000 e 2019. A criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) e a adoção de instrumentos como as Aquisições do Governo Federal (AGF) e o Contrato de Opção de Vendas (COV) visam mitigar essas vulnerabilidades, mas a necessidade de importações para suprir o consumo interno de alguns produtos básicos ainda é realidade.
O aumento da produção de milho e carne bovina, bem como a crescente demanda interna, destaca a importância de estratégias integradas para garantir a segurança alimentar e persistência de estoques. Os Estados Unidos, sendo um dos maiores produtores e consumidores de alimentos do mundo, adotam uma abordagem aprofundada na gestão de segurança alimentar através de agências como a FDA, Food Safety and Inspection Service (FSIS) e Environmental Protection Agency (EPA). A produção elevada de milho e trigo, juntamente com a capacidade de exportação significativa, proporciona uma base sólida para a segurança alimentar. No entanto, a dependência de importações para alguns produtos e a implementação rigorosa de regulamentos de segurança alimentar destacam a importância de uma abordagem equilibrada entre produção interna e comércio exterior.
A dinâmica de mercado nos Estados Unidos reflete um equilíbrio entre alta produção, consumo robusto e manutenção de estoques substanciais para garantir a estabilidade. A União Europeia, com sua Política Agrícola Comum (PAC) e programas adjacentes, demonstra uma estratégia estruturada de segurança alimentar, integrando a formação de estoques reguladores e apoio a associações caritativas. A produção estável de trigo e a dependência de importações de milho refletem a necessidade de políticas adaptativas para atender às demandas internas e manter a competitividade no mercado global. A colaboração com parceiros internacionais, como o Brasil, para o abastecimento e fortalecimento de estoques, reforça a importância de uma abordagem de cooperação, para enfrentar os desafios de segurança alimentar na região. Fonte: Alcides Torres. Broadcast Agro.