13/May/2025
Os ecoparques da Orizon são uma espécie de complexos industriais montados em torno do lixo. A empresa, que faturou quase R$ 1 bilhão em 2024 e é uma das poucas novatas da B3 a ter as ações em alta nos últimos anos, trabalha no processamento de resíduos descartados e na produção de energia. Assim, em cada ecoparque há fábricas, construídas em torno do descarte, que produzem biogás a partir de lixo orgânico, matéria-prima para a indústria por meio da reciclagem, brita para construção civil, adubos provenientes de lodo de tratamento de esgoto, biomassa como combustível e créditos de carbono.
A empresa processa 11% dos resíduos coletados no Brasil, o que equivale mais ou menos ao lixo de 40 milhões de pessoas em 12 Estados do País. Uma das maiores transformadoras de resíduos e geração de energia renovável da América Latina, a Orizon está em processo de crescimento acelerado e consolidação do setor. Milton Pilão, CEO da empresa, diz ter grandes expectativas em relação à COP30 (30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima), que acontecerá em novembro, em Belém (PA). Para ele, o fato de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ter retirado o país do Acordo de Paris, só reforça a oportunidade de o Brasil se tornar protagonista do setor. A posição do governo norte-americano traz oportunidade para o Brasil assumir papel protagonista nessa agenda. O País tem o potencial para ser um grande provedor de soluções de mitigação de carbono para o mundo. Segue a entrevista:
Como é a atuação da Orizon?
Milton Pilão: A Orizon se posiciona na cadeia de valorização do resíduo, ou seja, tudo feito após seu descarte. O lixo brasileiro é composto, aproximadamente, por 50% de material orgânico (basicamente comida), 30% de recicláveis e 20% inertes. Nas unidades da Orizon, há processos para valorizar essas três partes.
Quais são esses processos?
Milton Pilão: Na parte orgânica, o resíduo passa a sofrer decomposição anaeróbica, inerente ao contato com o ar. Se você fizer uma experiência na sua casa, colocando esse resíduo dentro de um saco de lixo e deixá-lo fechado, depois de um dia ele já está cheio de um gás chamado metano. O que a gente faz nos nossos ecoparques, em escalas gigantescas, é encapsular todo esse resíduo orgânico descartado e por meio de tubulações, processos tecnológicos de sucção com pressão e temperatura controladas, puxar e reutilizar esse gás na cadeia produtiva, com a produção de gás natural renovável. Na parte dos recicláveis, temos nos ecoparques indústrias que fazem a triagem mecanizada dos reciclados que não conseguiram ser separados na coleta seletiva e ficaram junto ao lixo que sai da nossa casa. Essas plantas conseguem, por meio de leitores ópticos e sopradores, separar o que é reciclável e pode ser reutilizado: plástico, papelão e metais, que voltam como matéria-prima para a cadeia produtiva. Por fim, há o resíduo inerte, que é de construção civil. Por meio de processos industriais de hibridagem, eles são separados e transformados em brita, que pode ser reutilizada para a construção civil e obras viárias.
Nos últimos anos, políticas públicas buscaram criar mudanças setoriais, como o marco do saneamento, o plano nacional de resíduos sólidos, a lei dos créditos de carbono, do combustível do futuro... Essas leis deram o resultado esperado?
Milton Pilão: A gente brinca dizendo que nosso setor não carece de leis, mas de execução e implementação prática dessas leis. O marco do saneamento trouxe a obrigatoriedade do fechamento dos lixões. O Brasil gera 80 milhões de toneladas/ano de resíduos domésticos, sendo que aproximadamente 30 milhões ainda vão para mais de 2,1 mil lixões. Já houve mais de 3 mil deles, mas todos deveriam ter sido fechados até agosto do ano passado. Ou seja, a regulação existe, mas atrasos ocorrem por muitas razões. O Brasil é um dos países com os maiores porcentuais de lixões em operação. O marco do combustível do futuro também é importante para a transição energética, como o biometano, seja nas indústrias ou na logística, pela substituição do gás fóssil ou do diesel por gás natural renovável. Foi um marco muito importante e já estamos vendo um encaminhamento positivo. Também estão sendo discutidos vários decretos de economia circular e logística reversa, que é outro assunto muito importante. A regulação tem avançado.
A entrada da Petrobras na área de combustível do futuro pode dar nova perspectiva a esse mercado?
Milton Pilão: Sim. A Petrobras tem em andamento uma oferta, a ser decidida este mês, de aquisição de quase 700 mil m³ por dia de gás natural renovável. O setor está se preparando com investimentos bilionários para suprir essa demanda que virá da lei do combustível do futuro. O gás brasileiro é hoje basicamente fóssil - por volta de 1% do gás natural utilizado no País é renovável. Tem muito mercado e muita demanda para a transição energética do gás, que será feita tanto para a indústria, que hoje tem uma oferta muito pequena de gás natural renovável, quanto para a logística. O Brasil hoje tem uma frota de quase 3,2 milhões de caminhões rodando com diesel, sendo que 25% desse combustível é importado. Podemos substituir boa parte dessa frota para utilizar combustível renovável e biometano.
As empresas costumam reclamar da falta de infraestrutura para adoção do gás natural em larga escala. No caso do biometano, há o mesmo problema?
Milton Pilão: Os gasodutos estão conectados principalmente ao litoral brasileiro. O gás natural renovável é conectado a eles, mas também é vendido a outras regiões com o produto comprimido ou liquefeito. Comprimido, o gás é transportável por 200 ou 300 quilômetros de distância a partir dos ecoparques e o GNL (gás natural liquefeito) pode viajar até 1,5 mil quilômetros ou ser exportado.
A Orizon cresceu de maneira acelerada nos últimos anos. Qual foi o principal desafio?
Milton Pilão: Teve várias razões para esse crescimento, mas um dos motivos mais importantes foi ter sido pioneira nas tecnologias de valorização de resíduos. Fomos a primeira empresa a falar que o lixo poderia ser utilizado como matéria-prima, por meio de implantação de tecnologia, o que não era muito visto ou priorizado aqui no País. Não inventamos a roda: copiamos o que é feito nos Estados Unidos e na Europa, há mais de 20 anos. Vimos essas tecnologias lá fora e as trouxemos para cá - foi a grande virada de chave. Desde nossa abertura de capital, em fevereiro de 2021, e a implantação dessas tecnologias em todos os ecoparques, a empresa deu saltos de crescimento, com receita proveniente da valorização dos resíduos, da venda de gás natural, energia elétrica, crédito de carbono, reciclados ou combustível derivado de resíduos.
Como está a frente dos créditos de carbono?
Milton Pilão: O crédito de carbono do aproveitamento de resíduos vem do encapsulamento do metano, que deixa de ir para a atmosfera. Aliás, a Orizon foi a primeira empresa a ter projeto de crédito de carbono certificado na ONU. O metano é responsável por aproximadamente 3% das emissões globais de gás do efeito estufa. Mas, quando valorizamos o resíduo, temos o potencial de mitigar quase 20% das emissões na cadeia produtiva.
Por quê?
Milton Pilão: Uma coisa é eu não deixar o metano ir para a atmosfera. Outra é transformar o metano em gás natural renovável, que vai para a indústria substituir o combustível fóssil.
Fonte: Broadcast Agro.