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31/Oct/2025

Mudanças climáticas e impactos nos mais pobres

Em todo o mundo, há cerca de 1,1 bilhão de pessoas vivendo em condições de "pobreza multidimensional aguda", aquela que define a pobreza não só pela falta de renda, mas por um conjunto de privações, como saúde, educação, habitação, saneamento básico, energia elétrica, água potável e acesso à informação. Desse número gigantesco, quase 900 milhões de pessoas, ou cerca de 80%, estão diretamente expostas a riscos climáticos, por viverem em regiões mais suscetíveis ao impacto, por exemplo, do calor extremo, inundações, seca ou poluição do ar. Esse cruzamento entre índices de pobreza e risco climático, feito de maneira inédita, é um dos méritos de um relatório divulgado pela ONU e pela Iniciativa Pobreza e Desenvolvimento Humano de Oxford, da Universidade de Oxford. Intitulado “Global Multidimensional Poverty Index 2025” ("Índice de Pobreza Multidimensional Global de 2025 - Dificuldades sobrepostas: pobreza e riscos climáticos"), o documento não só reafirma o quanto a pobreza está longe de ser um problema socioeconômico isolado, como reforça o que a ciência vem alertando, isto é, sua conexão direta com instabilidades planetárias.

Afinal, efeitos climáticos extremos são parte da rotina dos mais vulneráveis e integram o conjunto de alertas de especialistas para tentar tornar mais ambiciosos os compromissos em negociação durante a COP30, em Belém. Ninguém está imune aos efeitos das mudanças climáticas. Mas, os mais pobres enfrentam o impacto mais severo. A constatação reforça uma verdade incômoda: o aquecimento global é também um problema de desigualdade. A pobreza e o clima formam um círculo perverso, pois a escassez de recursos obriga milhões a depender de atividades frágeis, como a agricultura de subsistência e o trabalho informal, justamente as mais afetadas por eventos extremos. Quando secas e enchentes se alternam com frequência, tanto comprometem o sustento quanto destroem o pouco que resta. O relatório mostra a África Subsaariana e o Sul da Ásia como regiões especialmente críticas. Mas, o Brasil também faz parte desse retrato. Enchentes no Rio Grande do Sul, deslizamentos em Petrópolis (RJ) e no litoral de São Paulo, estiagens na Região Nordeste e queimadas na Amazônia revelam um mesmo padrão: são os mais pobres que mais perdem.

Reconhecer essa conexão contribui também para qualificar o debate, reduzindo o peso de teorias exóticas como a do "racismo ambiental", segundo a qual pessoas negras estão mais expostas às mudanças climáticas, como se estivessem um grau acima na escala de vitimizações por causa da sua cor. Ora, negros são, em média, mais pobres do que brancos; logo, qualquer problema social que tem a ver com pobreza ou desigualdade os afetará desproporcionalmente. Por exemplo, se a grande maioria de moradores de favelas e áreas de risco se declara preta ou parda, é natural (ainda que perverso) que enchentes atinjam em maior grau pessoas negras. O despreparo das cidades agrava esse quadro. A maioria dos municípios carece de planos de adaptação às mudanças climáticas, sistemas de drenagem eficientes e políticas de habitação que evitem a ocupação irregular de encostas e margens de rios. Embora, nos fóruns globais, o Brasil defenda metas ambiciosas de descarbonização e desenvolvimento sustentável, internamente a distância entre intenção e prática ainda é profunda.

Poucos municípios atualizaram a necessária integração da pauta climática aos planos diretores urbanos. A ausência de saneamento básico, ainda uma realidade para mais de 90 milhões que não têm coleta de esgoto e 34 milhões sem acesso a água potável, amplifica o impacto das enchentes e da contaminação. A falta de áreas verdes amplifica o calor nas grandes metrópoles. A COP30 será um teste de coerência. Para o Brasil, que tem o dever de tornar realidade as promessas do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de "liderar pelo exemplo"; e para os demais líderes mundiais, que terão diante de si uma encruzilhada: continuar tratando o aquecimento global como uma agenda para o futuro, ou encará-lo como o que ele realmente é, uma emergência que ameaça a justiça social e a própria sobrevivência coletiva. A redução da pobreza e a adaptação ao clima são faces desse mesmo desafio. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.