15/Mar/2021
Depois de sete meses com a taxa básica de juros brasileira no menor nível da história, o Banco Central deverá tomar nesta semana uma decisão que não adota desde 2015: aumentar a Selic. Apesar da segunda onda da pandemia de Covid-19 sinalizar ainda tempos difíceis para a economia e o crédito, a subida dos preços de alimentos e combustíveis pressiona o Comitê de Política Monetária (Copom) a começar um novo ciclo de aperto financeiro. É preciso voltar a julho de 2015 para encontrar a última vez que a autoridade monetária elevou os juros. Na ocasião, o Copom liderado por Alexandre Tombini elevou a Selic em 0,50%, levando a taxa para 14,25% ao ano. Na época, o balanço de riscos do Banco Central contava com problemas semelhantes aos de 2021, com inflação em alta, Real desvalorizado e fraca atividade econômica.
Quando a pandemia de Covid-19 chegou ao Brasil no ano passado, o Banco Central foi forçado a acelerar a redução da Selic, que já vinha ocorrendo nos últimos anos em um ambiente de inflação controlada e retomada gradual da economia. Entre fevereiro e agosto de 2020, os cortes sucessivos do Copom baixaram a Selic de 4,50% para 2,00% ao ano, onde ficou estacionada até agora. Quanto menores os juros básicos da economia, mais barato fica o crédito para empresas e famílias, o que possibilitou o crescimento dos financiamentos no auge da crise e ajudou a segurar as quedas na atividade e no emprego. O problema é que agora o Banco Central se depara com um aumento contínuo da inflação, puxada pelos alimentos e pelos combustíveis. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou fevereiro com alta de 0,86% e já acumula um crescimento de 5,20% nos últimos 12 meses.
A meta de inflação para o fim de 2021 é de 3,75%, com uma margem de tolerância de 1,5% (de 2,25% a 5,25%). Nesse cenário, apesar da segunda onda da pandemia de Covid-19 e das medidas de lockdown tomadas por diversos governos estaduais apontarem para uma nova retração da economia nos meses à frente, o mercado aposta em uma alta consistente nos juros nesta semana. O Copom se reúne entre terça-feira e quarta-feira (16 e 17/03). Na comunicação da última reunião do Copom, em janeiro, o colegiado já havia deixado a porta aberta para a retomada de um ciclo de alta de juros. Desde então, as apostas da maioria no mercado migraram de 0,25% de aumento para 0,50% seguindo a trajetória de aumento nos preços e a crise dos combustíveis. Com as ameaças de desidratação da PEC Emergencial pelo Congresso que levaria a uma deterioração fiscal ainda maior do País, diversos analistas chegaram a alertar para a possibilidade de um aumento de até 0,75% de uma só vez, mas a aprovação do texto com um teto para a nova rodada do auxílio emergencial afastou essa hipótese.
Mas, os impactos da segunda onda da pandemia sobre a economia podem impedir que o Copom "pese a mão" na alta dos juros em março. O movimento deve ser mais gradual, com duas altas de 0,50% a partir da reunião seguinte, em maio, e mais uma elevação de 0,25%, encerrando o ciclo em 3,5%. A pandemia piorou muito, e pode haver o fechamento extremo das principais regiões produtivas do País. É preciso lembrar que as decisões do Banco Central têm um efeito defasado sobre a economia, e o horizonte relevante do Copom já está olhando mais para 2022, cujas expectativas de inflação seguem ancoradas. Subir demais os juros agora vai pressionar ainda mais os setores de serviços e da indústria. Um aumento de 0,25% agora significaria que o Banco Central continua enxergando um ambiente incerto e duvidoso, enquanto uma elevação de 0,50% sinalizaria uma certeza maior por parte do Copom sobre a evolução do cenário.
A realidade vem se impondo, mas não se sabe como vai ser a conjuntura econômica daqui a duas ou três reuniões. O cenário econômico é pessimista, com dados de ocupação de UTIs, óbitos e vacinas. Porém, alguns analistas preveem uma atuação mais firme do Copom, com possibilidade de seis altas consecutivas de 0,50%, levando a Selic para 5,00% até o fim do ano. O IPCA para 2021 já está perto do teto e deve ultrapassar. Até segunda ordem, o preço das commodities, dos alimentos e dos combustíveis é para cima. E é preciso lembrar que as despesas no Brasil ainda são muito indexadas à inflação, com o risco fiscal do País. Apesar da aprovação da PEC Fiscal com um teto de R$ 44 bilhões para a nova rodada do auxílio emergencial, recuperação pelo ex-presidente Lula de seus direitos políticos pode resultar em uma guinada populista por parte do presidente Jair Bolsonaro, de olho nas eleições de 2022.
A troca de comando na Petrobras para fazer um aceno aos caminhoneiros já foi uma sinalização. E agora o efeito Lula gerou ainda mais dúvidas sobre a consistência dos ajustes econômicos. Há dúvidas se o governo vai conseguir retirar o auxílio emergencial em agosto quando a inflação estiver no auge. As expectativas de inflação vêm subindo desde o começo do ano e começam a se aproximar desconfortavelmente do teto da meta para 2021. O contexto é pressões cambiais, alta de commodities e insumos, repasse do atacado, além de toda uma incerteza no campo fiscal e político. A taxa atual de 2,00% ao ano para uma inflação corrente que é o dobro disso resulta em uma taxa de juros real negativa que não condiz mais com o risco brasileiro. A pandemia preocupa e, só por causa da atividade, que a alta nos juros pode não ser de 0,75% nesta reunião. Mas, se o risco de contaminação da inflação de 2022 aumentar nos próximos meses, os próximos passos do Copom podem incluir altas ainda maiores na Selic. Fonte: Agência Estado. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.