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28/May/2024

Entrevista com Eric Hansotia – CEO global da AGCO

Para o CEO global da fabricante de máquinas agrícolas AGCO, Eric Hansotia, o Brasil é o principal país em expansão no mundo dentro do agronegócio. O executivo considera que o mercado brasileiro só não é maior do que os Estados Unidos para a empresa, dona das marcas Massey Ferguson, Fendt e Valtra. "Eu tenho ido ao Brasil pessoalmente há 20 anos e entendo que é um mercado fundamental", disse em entrevista ao Broadcast Agro. De acordo com Hansotia, 15% das vendas da AGCO no mundo são oriundas do País. Com foco em agricultura de precisão e em máquinas que funcionam mesmo em áreas em que a conectividade é mais escassa, como ocorre em diversas regiões agrícolas brasileiras, a AGCO lançou este ano a PTx, marca fruto da parceria entre a equipe de Precision Planting da AGCO e da PTx Trimble, joint venture para a qual a companhia desembolsou US$ 2 bilhões no ano passado para sua criação. Segue a entrevista:

Por que investir US$ 2 bilhões em agricultura de precisão?

Eric Hansotia: A população está crescendo para 10 bilhões de pessoas, a gente tem mais carne na dieta, que é um multiplicador na demanda por grãos, e tem mais uso de biocombustíveis para se ter um ambiente mais limpo. Tudo isso significa que o produtor vai ter de produzir 50% mais grãos do que produz hoje e a sociedade quer que ele faça isso sem usar mais fertilizantes, herbicidas e combustível. A solução para isso é a agricultura de precisão. Por isso, fizemos esse grande investimento, porque estamos tentando ser os líderes na agricultura de precisão e no desenvolvimento de máquinas e inteligência.

Em quais outras tecnologias a AGCO está investindo esse ano? Existem outros planos de lançamento nesse sentido ou o foco estará totalmente voltado para a Ptx?

Eric Hansotia: As duas coisas. O Precision Planting tem sido excelente e líder de mercado para resolver soluções agronômicas, como automatização do processo de amostragem do solo e automação de plantadeiras. Agora, estamos focando em produtos com sistema de visualização, que possam diferenciar o que é uma planta e o que é uma invasora, colocando inteligência artificial para que os herbicidas possam ser aplicados apenas em ervas daninhas, com economia de 70%. Na área de colheita, o grupo do Precision Planting vai lançar produtos desde o início do plantio até a colheita. O grosso dos produtos da Trimble também tem a ver com soluções de manejo hídrico, comércio de carbono e outras soluções, como aplicação direcionada.

Em entrevista, o senhor falou no investimento em máquinas que funcionem mesmo em áreas em que não exista conectividade no Brasil, por causa de extensão territorial, que cria dificuldade nesse sentido. Mas existem investimentos da AGCO no Brasil com o intuito de ampliar a conectividade no campo?

Eric Hansotia: A maior parte das nossas soluções foram criadas para não se precisar de internet para ajustes em tempo real. Isso significa que os sensores da máquina tomam decisões para mudar as configurações, ajustando as operações sem conexão. A gente precisa obter informação da máquina para manutenção preventiva e para poder capturar o que foi feito, plantado e colhido, mas isso pode acontecer um ou dois dias depois, quando a máquina voltar para a sede. É assim que os produtores trabalham. Estamos ajudando o produtor a criar uma cobertura em uma área local, para que ele possa ter conectividade com o celular na fazenda. Estamos também utilizando satélites para conectividade via satélite. São soluções cinco vezes mais caras do que a cobertura terrestre de celular, mas, para algumas aplicações, os produtores dizem que querem uma conectividade em tempo real. A gente acha que isso só vai ser necessário quando as máquinas forem totalmente autônomas. Teremos um kit autônomo no mercado a partir de 2025, para pegar um trator existente e deixá-lo autônomo. Vamos aplicar mais em soluções para máquinas para se ter uma autonomia do ciclo até 2030. É aí que a conectividade em tempo real vai ser mais importante, mas hoje ela não é tão crítica.

De acordo com os mais recentes balanços, as vendas na América do Sul vêm apresentando queda. O que motiva esse recuo e qual a situação no Brasil?

Eric Hansotia: Para falarmos em desempenho no Brasil, precisamos falar em curto e em longo prazo. A longo prazo, o Brasil é um mercado de crescimento, provavelmente o que mais nos anima no mundo. Estamos investindo muito no Brasil para apoiar essa estratégia de crescimento. A curto prazo, os produtores passam por altos e baixos no ciclo de lucratividade. Nos últimos anos, o lucro dos produtores estava muito forte, a demanda super alta, e estávamos trabalhando para poder apoiar toda essa demanda nos últimos dois a três anos. Durante 2023, o preço dos grãos começou a cair rápido, então a lucratividade dos produtores brasileiros, junto com a possibilidade de financiar novas máquinas, caiu em um período muito curto. A demanda de mercado desacelerou muito. Não é alarmante, já aconteceu e eu acredito que vá acontecer de novo no futuro porque é assim que o mercado funciona. Estamos nesse ciclo de demanda mais baixa por causa de uma menor lucratividade dos produtores. Acho que em 2024 a gente vá passar por essa curva, chegar ao mínimo, e a partir de então o Brasil vai retomar o crescimento.

Então o Brasil vai retomar o crescimento já neste ano?

Eric Hansotia: Potencialmente, tudo vai depender do preço dos grãos. Pode ser no segundo semestre deste ano ou no ano que vem. É um pouco precoce dizer isso, mas com os novos programas de financiamento que entram em vigor no meio do ano, é possível que o Brasil possa começar a crescer no segundo semestre. Se não, esperamos que seja retomado em 2025. As linhas de financiamento são um elemento importante. Os preços das commodities estão baixos para os produtores e eles estão segurando as compras. Uma combinação de retomada de capacidade de financiamento com a recuperação dos preços dos grãos vai permitir que os produtores voltem a comprar em algum momento.

Você já vê os preços dos grãos subindo no segundo semestre?

Eric Hansotia: Possivelmente, esse é um negócio sazonal. Tudo depende de como vai ser o plantio no Hemisfério Norte e como será comercializada essa safra. Se ela for muito grande, os preços não devem se recuperar, mas se tiver desafios como tivemos nos últimos anos, podemos ter uma recuperação de preços.

No Brasil, a previsão é de vendas mais baixas em máquinas agrícolas este ano, em virtude do menor preço dos grãos e quebra de safra. A AGCO também espera esse recuo?

Eric Hansotia: Esperamos que 2024 seja um ano de volume mais baixo do que 2023. Isso varia por região, mas esperamos que a indústria vá cair de 10% a 15% no mundo todo, por conta desses fatores que mencionamos, de menor preço do grão e produtor segurando um pouco as contas. Vai ser um ano de um mercado mais leve, vindo de uma demanda muito forte em 2023, por causa de uma renda menor para o produtor. Esperamos que isso prevaleça em grande parte de 2024. Em 2023, as nossas vendas somaram US$ 14,41 bilhões e neste ano temos previsão de US$ 13,6 bilhões, queda menor do que a da indústria. Esperamos continuar ganhando participação de mercado.

Qual a importância do mercado brasileiro para AGCO? Ele corresponde a quanto dentro da receita total da empresa?

Eric Hansotia: É o mercado de crescimento mais importante no mundo, a máquina de exportação para o planeta, sobretudo para soja e milho. Os produtores do mundo inteiro terão de ser mais produtivos, mas o Brasil é a máquina de exportação. Por isso que investimos tanto no Brasil, porque ele representa 15% das nossas vendas, mas tem muito mais importância do que isso em termos da nossa atenção, investimentos e por aí vai.

Em abril, o governo anunciou a adoção de cota referente à média das importações de aço entre 2020 e 2022, acrescida de 30%. O que exceder, será sobretaxado em 25%. Como essa decisão pode afetar a AGCO, em um ano que tem expectativa de quedas de vendas?

Eric Hansotia: Estamos sentindo uma pressão inflacionária no mundo todo, mas muito menor do que era nos últimos dois a três anos. Estamos trabalhando para tirar custos dos nossos negócios e nossa equipe de liderança se reuniu no ano passado e neste ano com esse objetivo. Estamos mais enxutos, oferecendo produtos para os produtores que estão com o lucro mais apertado. Temos de fazer todo o possível para manter os preços baixos para os produtores e tornar as máquinas lucrativas para eles.

Na visão da AGCO, a decisão pode afetar também as relações comerciais entre Brasil e China?

Eric Hansotia: O Brasil é o maior exportador e a China é o maior importador, então ficamos de olho na China, para monitorar a demanda global de grãos e comparamos isso com a oferta gerada pelos produtores. A China está trabalhando duro para plantar mais grãos, mas eles têm limitações de terras e áreas pequenas, ao contrário do Brasil. É difícil tornar esses pequenos talhões produtivos como vocês fazem no Brasil, e lá falta água na maior parte da terra, o que é importante para eles. Para nós, a China continuará tendo uma grande demanda por combustíveis e alimentos.

Fonte: Broadcast Agro.