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06/Aug/2024

Marco Temporal: audiência de conciliação no STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou nesta segunda-feira (05/08) a primeira audiência de conciliação sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas em meio a críticas de representantes dos povos originários ao processo de conciliação conduzido pelo ministro Gilmar Mendes. Gilmar é relator das ações que tratam da constitucionalidade da lei que estabeleceu o marco temporal após o Supremo invalidar a tese, em setembro do ano passado. Em abril deste ano, ele suspendeu a tramitação de todas as ações que questionam a Lei do Marco Temporal e abriu um processo de conciliação sobre o tema. A decisão do ministro tem sido questionada por representantes dos povos indígenas, que pedem a suspensão cautelar da lei e a redistribuição das ações para o ministro Edson Fachin. Eles dizem que Gilmar Mendes não apreciou seus pedidos, nem os levou para o plenário da Corte. Fachin é relator do processo original sobre o marco temporal e já reiterou, em manifestação pública, que não vê dúvidas de que a tese é inconstitucional.

Na ocasião do julgamento, Gilmar também votou contra a tese do marco temporal, mas fez ressalvas à amplitude das demarcações. Ele disse que “não falta terra” aos indígenas, mas que “falta apoio de estrutura básica”. Além disso, é visto no agronegócio como um ministro alinhado às pautas do setor na Corte. A decisão de enviar o caso para conciliação foi submetida ao plenário, mas o julgamento foi suspenso pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo. Agora, cabe a ele definir uma nova data. A não apreciação desses questionamentos feitos em sede de embargos coloca em xeque a possibilidade de se sentar à mesa para conciliar, pois os povos indígenas estão sendo direcionados para uma composição precária e incerta, sem uma metodologia definida, deixando aberta para as mais duvidosas intenções, disse a Articulação dos Povos Indígenas (Apib) em manifestação enviada a Gilmar Mendes.

Indígenas e parlamentares se reuniram com Fachin em julho para relatar preocupações com o processo de conciliação. Para a Apib, Gilmar não responde à petição e marca uma conciliação que está prevista para negociar direitos fundamentais. A percepção é de que os indígenas entraram em uma negociação perdendo. Em manifestação enviada à Corte em 25 de julho, a Apib reforçou o pedido de suspensão da lei sob o argumento que há perigo de dano irreversível contra a vida e existência dos povos indígenas do Brasil. A petição alerta, ainda, que a mora na solução desta controvérsia poderá gerar a responsabilização do estado brasileiro perante os organismos internacionais de proteção aos Direitos Humanos. Outro pleito da Apib é que a Procuradoria-Geral da República (PGR) possa atuar com direito a voz e voto na comissão criada para a conciliação. De acordo com a decisão de Gilmar, um representante da PGR poderá participar da conciliação “apenas na condição de observador”.

A Apib aponta que um dos papéis do Ministério Público é zelar pelos direitos dos povos indígenas. Em junho, a Advocacia-Geral da União (AGU) disse que concorda com a tentativa de acordo, mas ressaltou que a tese do marco temporal é “inconciliável”. O ministro Jorge Messias apontou que a negociação pode focar nos dispositivos relacionados aos aspectos patrimoniais na Lei do Marco Temporal, desde que respeitadas as teses fixadas por essa Suprema Corte. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, também foi intimado a se manifestar, mas disse que se reserva para opinar sobre o tema de fundo após a conclusão dos trabalhos da comissão especial. Ele defendeu, contudo, que a relatoria do processo seja mantida com Gilmar, e não se opôs à condição de observadora imposta à PGR. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse no mês passado estar muito entusiasmado com a iniciativa do STF de, ao invés de simplesmente decidir pela inconstitucionalidade daquilo que foi aprovado no Congresso, de poder inaugurar um ambiente de conciliação e composição.

Gilmar Mendes fixou o dia 18 de dezembro como prazo final para a tentativa de acordo. A comissão criada para discutir o tema será composta por seis membros indicados pelo Congresso e seis indicados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), além de representantes dos autores das ações, da União, dos Estados e municípios. O Senado indicou o senador Jacques Wagner (PT-BA), com Jader Barbalho (PA-MDB) como suplente, e a senadora Tereza Cristina (PP-MS). A Câmara ainda não indicou representantes. Dos quatro processos em curso, três foram ajuizados por partidos de esquerda e pedem a inconstitucionalidade da tese. Outra ação, que pede a validação da lei, é do PP, Republicanos e PL. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que a conciliação é sempre melhor do que conflito ao abrir a primeira audiência que busca um acordo sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas.

Embora caiba ao STF a interpretação final da Constituição, ele afirmou que considera institucionalmente desejável encontrar solução que consiga harmonizar diferentes visões. Barroso afirmou que a audiência é uma "situação incomum" e uma "experiência pioneira". O ministro ainda destacou que a boa-fé e a boa vontade são valores chave para as discussões e que, se não houver perspectiva real de avançar em acordo, o STF vai retomar o julgamento. "Ninguém deve participar desse esforço achando que já ganhou", alertou Barroso, que também disse que "a procrastinação não está posta na mesa". Barroso ainda reafirmou sua visão pessoal sobre o tema, que manifestou no julgamento que declarou a inconstitucionalidade do marco temporal. "Porém, preferi aguardar esforço de conciliação proposto pelo relator, que considero iniciativa louvável", disse. Um dos motivos para isso é que existe uma clara divergência entre o Judiciário e Executivo, de um lado, e do Legislativo, de outro.

O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes afirmou que a Suprema Corte não vai admitir solução em relação ao marco temporal de terras indígenas que não contemple a Constituição Federal e a preservação dos direitos fundamentais. É importante que se estabeleça premissa séria no início desses trabalhos. O caminho escolhido pelo Estado brasileiro para a questão indígena é infelizmente a omissão vexatória, disse Mendes ao discursar na primeira audiência de conciliação que busca um acordo sobre o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O ministro afirmou que o resultado da Comissão será submetido ao crivo do plenário da Casa. Não há pacificação social com imposição unilateral de vontades. Esse País comporta todos nós em seus múltiplos modos de vida e valores, acrescentou. Gilmar Mendes lembrou que o artigo 5º da Constituição Federal estabelece que a União concluiria a demarcação das terras indígenas cinco anos após a promulgação, em 5 de outubro de 1988.

O ministro citou dados de organizações indígenas que mostram que há 270 terras indígenas pendentes de demarcação, sendo 12 homologadas, enquanto há 409 regularizadas. O direito dos povos originários é regido ainda no plano infraconstitucional pelo Estatuto do Indígena. A sociedade brasileira não foi capaz de implantar os compromissos assumidos e nem mesmo de atualizar a legislação. Gilmar Mendes voltou a defender que é possível realizar a demarcação de terras indígenas sem desrespeitar as ocupações consolidadas ao longo do tempo e de boa fé. É necessário demarcar terras indígenas e conferir aos seus habitantes meios de conseguir seus propósitos e objetivos, não com a tutela do Estado, mas como pessoas plenas e independentes. O ministro afirmou que tratar aqueles que ocupam as terras em situações consolidadas como violadores não resolverá o debate. Muitos casos de titulação decorreram de ações dos governos federal e estadual.

Há inúmeros direitos fundamentais em jogo no conflito que perdura por séculos. A ‘vilanização’ de indivíduos e a utilização de lentes monocromáticas empobrece o debate e inviabiliza a construção de soluções. A inação não é mais uma opção. A crise não vai se resolver sozinha. Gilmar Mendes citou dados recentes de investida de fazendeiros sobre povos indígenas na Região Centro-Oeste e de invasões de terras privadas ao mostrar que o conflito é crescente. Mendes citou também o projeto de lei 2.903/2023, aprovado pelo Congresso, que estabelece o marco temporal para demarcação de terras indígenas, ou seja, serão passíveis de demarcação apenas áreas em que estiverem ocupadas pelos povos indígenas na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. O Parlamento brasileiro não parece ter produzido resultado que tenha pacificado o tema com a lei. É uma janela de pacificação histórica que deve ser aproveitada por todos para que se tente produzir resultado pacificante, defendeu Mendes.

O ministro observou que "problemas complexos não se resolvem com soluções simplistas ou com "desinteligência" entre as esferas de Poder. A intenção é pacificar os ânimos e ver o que de bom pode-se aprender com a sociedade civil. É chegada a hora de todos se sentarem à mesa e chegarem a um consenso mínimo. A senadora e ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS) afirmou esperar que se alcance um "denominador comum" no debate do marco temporal para demarcação de terras indígenas. Quase foi possível chegamos a um entendimento no passado com a mesa de negociação do governo federal. Ela afirmou desejar que se chegue a um acordo sem que ninguém saia prejudicado. Tereza Cristina espera que os trabalhos da comissão e a conciliação sejam passíveis de serem alcançados antes de 18 de dezembro, data prevista para o fim dos encontros. Há situações graves acontecendo, como invasões, ponderou.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou que há alguma margem para negociação no tema e que o diálogo pode ser importante, mas sem nunca abrir mão dos direitos dos povos indígena. Grande parte da violência contra os povos indígenas decorre da omissão do Estado brasileiro. A PGR não terá voto na comissão e participa apenas como observadora. O governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB-MS), afirmou que a busca pela pacificação e pela segurança jurídica no debate do marco temporal é almejado por todos os Estados. Riedel representa o Fórum dos Governadores. Ele acrescentou que espera que o colegiado avance também, além das questões agrárias e de conflito de terra, em políticas públicas para povos indígenas. Hoje, há esforço para fornecer o básico, como água. A expectativa é de que a política pública seja objeto do colegiado para ajudar a mitigar o sofrimento das comunidades indígenas. A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) pediu que a comissão conciliatória do Supremo Tribunal Federal busque soluções e caminhos que evitem retrocessos aos direitos dos povos indígenas.

Os povos indígenas precisam da garantia do Estado brasileiro de que venham a continuar sendo povos indígenas com a garantia de cláusulas pétreas, sem negar ou inviabilizar a existência de povos indígenas. Para a Funai, o lado mais frágil no debate são os povos indígenas. Os povos indígenas enfrentaram anos de violência e superaram o momento de assimilação dos povos. Os povos indígenas são cidadãos detentores de direitos, inclusive sobre projetos em suas próprias terras, seja de agricultura ou de extrativismo, mas que cada povo tenha sua concepção de projeto respeitada. A Funai busca diálogo no processo de demarcação das terras indígenas. A Articulação dos Povos Indígenas (Apib) reiterou o pedido para que a Lei do Marco Temporal seja suspensa para garantir "diálogo e equidade" na comissão que busca um acordo sobre o tema. Para a Apib, a não suspensão da lei antes do início dos trabalhos traz insegurança jurídica e uma "grave situação" de violência contra os povos indígenas. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.