12/Jun/2025
A 4ª Vara Cível de Sinop instaurou três novos incidentes para investigar condutas suspeitas no Grupo Safras, elevando a dez o total de procedimentos que apuram irregularidades no conglomerado com dívidas de R$ 1,78 bilhão. A juíza Giovana Pasqual de Mello atendeu pedido do Ministério Público que identificou novas práticas não cobertas pelas investigações em curso. As apurações focam na ocultação de contrato com fundos de investimento, procurações com poderes amplos concedidas a terceiro sem vínculo societário e apropriação indevida de grãos de produtores rurais. O MP informou ter recebido representação do advogado de credores "na qual são relatadas supostas fraudes patrimoniais e ilícitos penais atribuídos ao Grupo Safras Armazéns Gerais, seus sócios e entes vinculados". A primeira investigação apura a "ocultação de contrato de opção de compra de participação societária celebrado entre os sócios da recuperanda e os fundos Axioma e Alcateia".
O instrumento foi firmado em agosto de 2024 e previa que os fundos adquirissem 60% do capital do Grupo Safras por R$ 100 mil, com compromisso de aportar até R$ 400 milhões em três anos. O contrato foi registrado na Junta Comercial de Mato Grosso e posteriormente retirado dos arquivos, levantando suspeitas sobre tentativa de ocultação. A desembargadora Marilsen Andrade Addario, que suspendeu a recuperação judicial em maio, havia observado que "a gestão das sociedades recuperandas já estaria subordinada a terceiros" antes do pedido de reestruturação. A operação despertou atenção por prever transferência de controle majoritário por valor desproporcional ao patrimônio das empresas. A investigação deve esclarecer se houve intenção real de ceder participação acionária ou se constituía simulação para mascarar a estrutura societária. O segundo incidente foca na "outorga de procurações irrevogáveis e irretratáveis ao CEO da Flowinvest, Luís Henrique Wolf, com amplos poderes de representação dos sócios da recuperanda".
Wolf não possui vínculo societário com as empresas, mas teria recebido poderes extensos para representação em atos societários e operações financeiras. As procurações transferem prerrogativas decisórias para pessoa externa ao grupo, criando estrutura que pode dificultar rastreamento de responsabilidades. A característica de irrevogabilidade impede que os sócios recuperem controle sobre decisões estratégicas, mesmo em situações adversas. A investigação deve determinar o alcance dos poderes concedidos e as circunstâncias da outorga. A concessão dessas prerrogativas não foi informada no processo de recuperação judicial, levantando questões sobre transparência na gestão societária. O terceiro incidente investiga "apropriação indevida de grãos entregues em contrato de depósito, cuja propriedade pertencia aos credores Valdir Bobbi e Bernardino Campeol". A apuração se baseia em sentença judicial condenatória já proferida, demonstrando que práticas irregulares foram reconhecidas judicialmente.
Os contratos de depósito permitem que produtores armazenem grãos mantendo a propriedade dos produtos. A apropriação indevida constitui crime e indica possível utilização de ativos de terceiros para cobrir obrigações das empresas depositárias. A magistrada destacou que as acusações sobre a suposta ocultação do contrato de opção de compra de participação societária, firmado entre os sócios da empresa e os fundos Axioma e Alcateia, além das procurações irretratáveis concedidas ao agente externo Luís Henrique Wolf, ainda não foram analisadas em procedimentos específicos, o que motivou a abertura das novas apurações. Com os três novos incidentes, chegam a dez as investigações em tramitação. Os sete anteriores, instaurados em maio, apuram relação com o FIDC Bravano; cessão de crédito com deságio; ocultação do comando societário; desvio de ativos; dilapidação patrimonial; crimes como apropriação indébita e estelionato; e prestação de informações falsas.
O Grupo Safras é formado pelo Núcleo Safras, liderado por Pedro de Moraes Filho, e pelo Núcleo Rossato, comandado por Dilceu Rossato, ex-prefeito de Sorriso (MT). As empresas atuam em armazenamento, industrialização e comercialização de grãos, etanol e biomassa em cidades de Mato Grosso. A crise teve origem na queda dos preços da soja em 2023, dificuldades de acesso a crédito e problemas após aquisição da Copagri. A situação se agravou com falhas na migração de sistema de gestão no fim de 2023, comprometendo o controle financeiro. A recuperação foi deferida em 20 de maio, mas suspensa dez dias depois pela desembargadora Addario com base em indícios de fraude. Entre os problemas identificados estão operações suspeitas com o FIDC Bravano, ausência de livros contábeis e estruturas societárias irregulares. O FIDC Bravano, segundo maior credor com R$ 284,1 milhões, foi criado no primeiro semestre de 2024 e obteve rentabilidade "próxima a 380% do CDI".
A desembargadora identificou "suspeitas de utilização do Fundo Bravano para blindagem patrimonial e fuga de capitais". A perícia técnica identificou ajustes patrimoniais sem lastro de R$ 52 milhões, prejuízo operacional de R$ 360 milhões em 2024 e margem negativa superior a 300%. Também foram detectadas ausência de extratos bancários e balanços assinados por pessoas sem vínculo formal. Após a suspensão, o grupo perdeu ativos estratégicos. A Agropecuária Locks, controlada pelo bilionário Itamar Locks, executou mandado de arresto de cinco colheitadeiras avaliadas em R$ 14 milhões para garantir uma dívida de R$ 6,77 milhões. A Carbon Participações retomou a fábrica de Cuiabá, responsável por mais da metade do faturamento da Safras. A juíza determinou que a administradora judicial certifique os números e objetos das novas investigações. Também ressaltou que "o deferimento do processamento da presente Recuperação Judicial encontra-se suspenso", impedindo análise de pedidos vinculados ao prosseguimento do feito. Fonte: Broadcast Agro.