04/Out/2022

O Congresso Internacional do Trigo, organizado pela Abitrigo, em Foz de Iguaçu, entre 25 e 27 passados, mostrou que, mesmo dentro de um setor tão dinâmico como a cadeia vegetal do agronegócio, a triticultura surge um fato novo na agricultura brasileiras, com fortes perspectivas de negócios, inclusive de investimento no setor. O trigo é a única commodity importada pelo Brasil no comércio internacional. Dados recentes apontam que o Brasil possui uma demanda anual de 12,5 milhões de toneladas de trigo e, conforme números de 2022, devem ser produzidos no Brasil mais de 10 milhões de toneladas. Ou seja, o Brasil ainda depende da importação de 5 milhões de toneladas de trigo para atender sua própria demanda. Mas a situação começa a mudar: a produção interna está crescendo rapidamente e as exportações de trigo do Brasil para o exterior, em 2022, registraram um forte aumento.

Pela primeira vez, o Brasil deve exportar mais de 3 milhões de toneladas. Atualmente, a Região Sul do Brasil caracteriza-se como principal produtora de trigo no País, com destaque para os estados do Paraná e Rio Grande do Sul que, juntos, correspondem à 86% da produção nacional. Dessa Região, sai a totalidade das exportações brasileiras. Dessa forma, a Região Sul aparece como opção para investimento externo no aumento da produção local (produtores locais ou cooperativas) e/ou aquisição de novas terras para a cultura do trigo. Além dessa oportunidade de investimento externo na produção de trigo brasileira, começa a ser desenvolvido o projeto da Embrapa, conhecido como ‘trigo tropical’. De acordo com o presidente da Embrapa, Celso Moretti, o Brasil tem capacidade de se tornar autossuficiente na produção de trigo utilizando a tecnologia de produção do trigo tropical em 2 milhões de hectares nos cerrados.

Atualmente, o trigo tropical da Embrapa já ocupa 100 mil hectares nos cerrados de Goiás e Minas Gerais. Os países do Oriente Médio, por exemplo, representam hoje um importante mercado para produtos brasileiros, em especial do agronegócio. A expansão do trigo em novas áreas, como o norte do cerrado, surge como uma oportunidade importante para o Brasil e para os países árabes no desenvolvimento de parcerias em que os dois lados ganham. Os países dessa região, como a Arábia Saudita, são importadores de grandes quantidades de trigo no comércio internacional, inclusive com frequentes aberturas de licitações públicas realizadas pela entidade governamental saudita Saudi Grains Organization (Sago). Dados do International Trade Center indicam que a Arábia Saudita importou 656 mil toneladas de trigo no ano de 2021, com valores correspondentes a 407 milhões de dólares.

Entre os principais exportadores ao mercado saudita, destacam-se Ucrânia, Austrália, Polônia e Rússia. Em 2022, o Brasil vem ocupando posição de destaque no mercado internacional nas exportações de trigo aos sauditas (498 mil toneladas exportadas ao reino até agosto de 2022 - Agrostat). Do ponto de vista de investimentos, o principal ator na Arábia Saudita é a Saudi Agricultural and Livestock Investiment (Salic), braço agropecuário do fundo soberano da Arábia Saudita (PIF), que investe em projetos no exterior, com garantias de abastecimento, com o objetivo estratégico de garantir a segurança alimentar do reino. A Salic é acionista majoritária, com participação de 34%, do Grupo Minerva (um dos maiores exportadores de carne bovina do Brasil) e já manifestou, no passado, interesse em investir nos setores avícola e de grãos (especialmente trigo, milho e soja).

Outros produtos considerados prioritários para investimento no exterior pela Salic são cevada, arroz, açúcar, óleo vegetal e forragens. O que poderá ser acordado entre os países um porcentual de compartilhamento na quantidade produzida, a partir do investimento saudita, com o know-how e mão de obra brasileiros utilizada na produção local. Dessa forma, o investimento saudita no fomento à produção de grãos, especialmente o trigo tropical com tecnologia da Embrapa, poderá resultar na formação de joint ventures com empresas brasileira para a aquisição de terras para produção de trigo tropical, assim como, investimento na utilização da tecnologia para aumento da produção do trigo tropical no Brasil, no crédito e estímulo na produção de sementes específicas, instalação de moinhos necessários para aumento da produção do trigo tropical no cerrado e até mesmo investimento na logística para escoamento da produção de trigo no cerrado, como é o caso da Ferrovia Oeste-Leste (Fiol).

Contratos de fornecimento a longo prazo complementariam essa parceria. Diante da importância do projeto, a possível participação do BNDES teria papel estratégico e intimamente relacionado ao desenvolvimento econômico e social que será proporcionada pela produção de trigo tropical, a partir da utilização da tecnologia da Embrapa. Conjuntamente ao investimento da Salic, o BNDES poderá fornecer linhas de créditos para financiamento de máquinas e equipamentos para produtores locais, compra de sementes, aquisição de terras, instalação de moinhos e até mesmo investimento em infraestrutura para logística da produção. As áreas de investimentos da Salic e BNDES poderão ser definidas após tratativas iniciais entre os atores envolvidos. Fonte: Rubens Barbosa. Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo).